Algumas vezes só leva alguns minutos para mudar o modo como os alunos enxergam a ciência. Quando eles experimentam a emoção da descoberta, quando sentem que estão segurando os segredos da ciência nas suas próprias mãos – isto é, então, a Ciênsação.
A Ciênsação NÃO é um novo paradigma da didática, nem um novo método de ensino. Ao contrário, ensinar com experimentos rápidos e práticos é uma prática muito comum em escolas no mundo inteiro. Nosso objetivo é tornar mais fácil para você integrar esses experimentos à sua prática de ensino.
A maioria dos professores concorda que os estudantes aprendem melhor quando eles estão totalmente engajados - com mãos e mentes. Décadas de pesquisas e estudos, com milhares de alunos, confirmaram essa observação [PCAST, 2012; Hoellwarth and Moelter, 2011; Hattie, 2009; Prince, 2004; Hake, 1998; Stohr-Hunt, 1996]. Além disso, ao se obter um entendimento mais profundo de conceitos científicos, ativamente envolvidos, os estudantes reterão melhor o conteúdo ensinado [Bonwell and Eison, 1991]. Ademais, experimentos práticos e bem planejados favorecem a autonomia do estudante e promovem importantes habilidades tais como: o pensamento criativo e analítico, o trabalho em equipe e comunicação efetiva de ideias. Por último, mas certamente não menos importante, atividades engajadas de pesquisa tornam o ensino de ciências mais divertido para os alunos e professores.
Se você é um professor, provavelmente, já ouviu tudo isso antes. Mas por que então é tão raro ver isso na prática do dia a dia? A maioria dos professores lhe dirá que, embora tenha vontade de fazer atividades práticas com os estudantes, eles simplesmente não têm tempo ou recursos para isso. Utilizar uma aula inteira para produzir um experimento com a turma (além do tempo de preparação de uma ou duas horas) é um luxo, quando se tem que preparar seus alunos para a próxima prova.
A Ciênsação, portanto, quer compartilhar com você ideias de experimentos curtos (de alguns minutos apenas), que enfocarão alguns aspectos com perguntas claras e abertas. Para dar um exemplo prático, vamos imaginar que você queira abordar o magnetismo:
Após os alunos tomarem conhecimento sobre do tema da aula, você deve dizer a eles que trouxe alguns ímãs e os dispor sobre a mesa. De acordo com o seu estilo pessoal e dos alunos, você pode então:
Se você ja tiver conduzido alguns experimentos antes com essa turma, desenvolvendo uma rotina, pode ser que leve menos de 5 minutos, até os alunos estarem envolvidos em uma animada discussão, na qual compartilham suas descobertas sobre o magnetismo.
Até onde for possível, baseie sua aula nas experiências dos alunos e faça referência a seus comentários, mencionando o nome deles. Além de tornar o conteúdo da aula mais pessoal e memorável, isso proporciona um encorajamento aos estudantes, na medida em que escutam o professor citando suas ideias, observações ou explicações – isso também é Ciênsação.
Já que a informação relevante é facilmente acessível e continuamente modificada, as habilidades se tornarão muito mais importantes que a memorização de fatos. Resumindo, o desafio para se ter sucesso numa sociedade de conhecimento globalizado é assim descrito pelo Banco Mundial em 2010: “Os dados do mercado de trabalho no Brasil demonstram que as habilidades são importantes para a próxima geração de trabalhadores. Formar graduados com tais habilidades será uma mudança crítica para o sistema educacional na próxima década – graduados com a habilidade de pensar analiticamente, fazer perguntas críticas, dominar novas habilidades e conteúdos rapidamente, incluindo o domínio de línguas estrangeiras e a habilidade de trabalhar de forma eficaz em equipe." [Bruns et al., 2012, traduzido do inglês].
A tarefa de promover as habilidades da futura força de trabalho e inspirar a nova geração de cientistas e engenheiros, em última análise, é sua como professor. Especialmente, quando se dedica a temas do eixo "CTEM" – Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática. Praticamente todos os professores querem que seus alunos desenvolvam habilidades, todavia muitos encontram dificuldades em criar situações nas quais se permita aos estudantes explorar e descobrir, tentar, falhar e conseguir; assim como fazer com que se envolvam e vivenciem novas experiências, que são pré-requisitos para, no processo da instrução, ir além da mera transmissão de fatos. Entretanto, assim como um idioma não pode ser aprendido sem que nunca se permita aos estudantes falar, o desenvolvimento de competências exige que ações sejam realizadas por eles.
Não adquirimos habilidades apenas para promover a nossa carreira. Elas são necessárias para participar de forma consciente em debates públicos e processos democráticos. A habilidade de "formular perguntas críticas" [Bruns et al., 2012] é cada vez mais necessária para proteger as conquistas democráticas das mentiras dos demagogos. Os jovens precisam desenvolver autonomia intelectual baseada em evidências, quer dizer, o desejo e a habilidade de procurar evidência científica em vez de confiar sem sentido crítico nas autoridades. Essa ideia se vê refletida em muitos experimentos de Ciênsação, tais como "Acredite nos seus olhos, não na opinião alheia" e "O mito do mapa dos sabores". Em um artigo científico recentemente publicado na revista Physics Education do IOP [Abreu et al., 2017], foi debatida a abordagem que Ciênsação utiliza para desafiar o pensamento analítico dos alunos por meio de contradições, aparentes ou reais, entre resultados experimentais e afirmações dos livros didáticos. Cada vez que um aluno – e especialmente uma aluna – consegue conduzir e explicar um experimento, a sua autoconfiança e autossuficiência científica se elevam e, no final das contas, provavelmente isso seja mais valioso do que qualquer equação que aprenda de cor.
Abreu de Oliveira, M. H.; Fischer, Robert (2017). "Ciênsação: gaining a feeling for sciences", Physics Education, 52 (2)
Bonwell, C.; Eison, J. (1991). Active Learning: Creating Excitement in the Classroom AEHE-ERIC Higher Education Report No. 1. Washington, D.C.: Jossey-Bass. ISBN 1-878380-08-7.
Bruns, Barbara; Evans, David; Luque, Javier. (2012). "Achieving World-Class Education in Brazil", The World Bank, ISBN 978-0-8213-8854-9
Hake, R. R. (1998). Interactive-engagement versus traditional methods: A six-thousand-student survey of mechanics test data for introductory physics courses. American journal of Physics, 66, 64
Hattie, John (2009). "Visible Learning. A synthesis of over 800 meta-analysis relating to achievement" Routledge, ISBN 978-0-415-47618-8
Hoellwarth, C.; Moelter, M. J. (2011). The implications of a robust curriculum in introductory mechanics. American Journal of Physics, 79, 540
PCAST (President’s Council of Advisors on Science and Technology) (2012). Engage to excel: Producing on million additional college graduates with degrees in science, technology, engineering, and mathematics.
Prince, Michael (2004). "Does active learning work? A review of the research." Journal of Engineering Education, 93 (3), 223-231
Stohr-Hunt, Patricia M. (1996). "An analysis of frequency of hands-on experience and science achievement" Journal of research in Science Teaching 33 (1), 101-109
Quanto mais liberdade os alunos tiverem para desenvolver suas próprias ideias, mais eles se identificarão com suas atividades de pesquisa e com suas descobertas. Evidentemente, o uso efetivo e responsável dessa liberdade é algo que os alunos precisam aprender, e esse tipo de aprendizagem demanda tempo. No entanto, a experiência prática e a pesquisa demonstram que tal tempo é bem investido.
Para evitar experiências frustrantes, é essencial que seus alunos tenham uma ideia clara daquilo que é esperado deles. Discutir procedimentos e regras antes do experimento, bem como as consequências advindas de um comportamento perturbador, economizará bastante tempo em longo prazo.
Cada escola e cada aula têm seu próprio conjunto de procedimentos e regras, algumas das quais podem abranger atividades práticas. É interessante conversar com seus colegas e, o quanto for possível, deixar as regras explícitas. Eis aqui algumas sugestões que já provaram ser úteis:
Transição: o começo e o final da atividade de pesquisa são marcados por um sinal que você dá, por exemplo: bater palmas. Ao sinal de término da atividade, todos os alunos param de conversar e colocam o material na bancada.
Distribuição do material: os alunos da primeira fileira pegam o material da mesa do professor e distribuem para os outros.
Coleta do material: os alunos da última fileira recolhem o material para levá-lo à mesa do professor ou descartá-lo.
Apenas os alunos responsáveis poderão manusear o material.
Enquanto os alunos estiverem trabalhando na tarefa, você pode ir de grupo em grupo a encorajá-los e demonstrar-lhes um real interesse pelas iniciativas que eles tomam para trabalhar a questão de estudo. Esses momentos são boas oportunidades para interagir com os alunos que precisam de uma atenção adicional, como por exemplo, com os alunos particularmente quietos.
Faz parte da natureza da experiência que nem tudo aconteça de acordo com o planejado: se não há a possibilidade de dar errado, não é um experimento. A melhor preparação para o inesperado é o humor – rir com os alunos e então entender que lições podem ser aprendidas do resultado inesperado.
A indicação da duração do experimento se refere ao tempo da atividade prática mais o tempo destinado à distribuição e à coleta do material, mas não inclui a discussão que o experimento pode provocar. Dependendo da familiaridade que os alunos tiverem com os procedimentos, pode-se precisar de menos tempo ainda do que o indicado.
Mesmo assim, cada minuto conta. Portanto, aqui vão algumas dicas para maximizar o tempo gasto no aprendizado:
Muitos professores hesitam quanto a adaptar-se a métodos de ensino que fomentem habilidades, porque habilidades são mais difíceis de avaliar do que memorização de fatos. Embora isso seja compreensível, você deve ter notado que mais e mais avaliações nacionais e internacionais, como o ENEM ou o PISA, focalizam mais sua atenção em habilidades do que em conhecimento de fatos. Isso reflete a realidade do mercado de trabalho: em um contexto de rápidas mudanças tecnológicas e acesso geral à informação, seus alunos farão pouco uso de fatos memorizados, mas dependerão muito mais das habilidades aprendidas na escola.
Há diferentes modos de avaliar as habilidades que seus alunos desenvolverão durante um experimento da Ciênsação, entretanto, a maioria dos professores está interessada em incluir essa avaliação em provas tradicionais. Para se fazer isso, é importante que se leve em conta o tipo de atividade de pesquisa que seu aluno haverá de desenvolver. Alguns experimentos enfatizam a atenção em obter um entendimento e uma compreensão intuitiva de um fenômeno específico. Para confirmar se seus alunos desenvolverão, de fato, tal compreensão, você poderia redigir questões qualitativas sobre uma situação similar às condições do experimento. Por exemplo, após estudar a atividade de pesquisa “Conhecendo alguns sistemas de molas”, que utiliza molas de tração em paralelo e em série, você poderia verificar, durante um teste, se o conceito foi bem entendido, fazendo perguntas sobre o empilhamento de colchões ou sobre os quatro amortecedores de um carro.
Muitas das atividades de pesquisa desafiam o aluno a responder uma dada questão, através de experimentos que eles têm de desenvolver por si mesmos. Essa habilidade pode ser avaliada com questões abertas como a seguinte: “Como você poderia provar ou negar experimentalmente que...?”. Se, por exemplo, seus alunos estudarem que fatores determinam a velocidade de uma reação química, você poderia verificar se eles terão aperfeiçoado sua habilidade científica, perguntando como descobririam se o formato do recipiente utilizado no experimento tem influência na taxa de reação química.
Em alguns casos, é possível adaptar, nas provas, as questões da seção “perguntas orientadoras”. Isso lhe ajudará a verificar se eles terão aprendido a desenvolver um raciocínio que os levem a tirar conclusões baseadas em evidências.